CEGOS...



A mitologia apresenta cupido de olhos vendados. Para significar que o Amor é cego.
Deveria apresentar Belzebú de olhos também vendados. Porque o ódio tambem é cego. O
Amor é cego para os defeitos da criatura amada. O Ódio é cego para as virtudes do odiado.
Ocorre-me tais pensamentos ao considerar o ódio dos piritibanos ao nosso Mundo
Novo. Ódio absolutamente gratuito, sem motivo nenhum, sem nada que o justifique. Ódio
cego, totalmente cego!
Vejamos: − o povoado das Cinco Varzeas, com a chegada da ponta de trilhos da “Les-
te”, tornou-se comércio de Piritiba. Comércio que se desenvolveu rapidamente, assumindo
proporções de cidade: superior a algumas sedes de municípios. Daí a aspiração natural e
justa de se tornar sede de município, emancipando-se do município matriz. Acontece que
a área de seu distrito não somente a área, mas as demais condições: − eleitorais, demo-
gráficas, fiscais, etc. não lhe possibilitariam alcançar aquêle objetivo. Que fazer? Anexaram
ao seu território, sem plebiscito e sem autorização de Câmara de Vereadores, os distritos do
Largo e do França. E Mundo Novo, embora informalmente, accedeu. Poderia ter protestado
contra aquela anexação sem consentimento expresso das respectivas populações em plebis-
cito. Não o fez. Por generosidade, por consideração a Piritiba que tinha cabeça de município
mas não tinha corpo de município. Pois bem: não levaram em conta esta consideração que
lhes dispensou Mundo Novo e tramaram com políticos interessados nos seus votos, uma li-
nha divisória invadindo os distritos de Tapiramutá, Alto Bonito e Sede de Mundo Novo.
Alegavam êles, piritibanos. Mas a verdade é que os políticos citados por êles não esta-
vema autorizados pela Câmara de Vereadores ou pelo povo, para tal transação. E, por coin-
cidência notável, já destacada por mim em folhetim anterior, nenhum dos 3 políticos cita-
dos por êles é mundonovense!
Pois bem: − caído o município criado naquelas condições de invasão de territórios do
Município matriz, voltaram a repetir a mesma imprudência: invasão dos distritos de Alto
Bonito e Sede de Mundo Novo. E recúo,com ares de quem está fazendo um favor, do distri-
to de Tapiramutá. Proclamaram, aliás, cegos de ódio, que recuavam ali para possibilitar a
emancipação de Tapiramutá e, assim, fazer mal a Mundo Novo.
A preocupação de fazer mal a Mundo Novo é maior do que a de fazer bem a Piritiba. Se
a preocupação de fazer bem a Piritiba ocupasse primeiro plano, teriam o cuidado de criar
aquêle município de modo legal, livre dos riscos de nulidade. Mas o propósito de fazer mal a
Mundo Novo é tão forte que ficam cegos aos riscos de nulidade do seu próprio município.
Mundo Novo não tinha, como não tem, nenhuma obrigação de completar territórios pi-
ritibanos com territórios de outros distritos cujas populações não sejam ouvidas em plebisci-
to. Mesmo assim abriu mão de dois distritos. Envez de agradecerem, manifestam, de toda
forma, rancor ao doador que lhes tem sido de uma generosidade maternal!
Quem tem grande área de terra, não tem nenhuma obrigação de dar ou vender terra
ao visinho possuidor de pequena área. Esceção apenas: nas desapropriações legais. Le-
gais! Apropriar-se de territórios que lhes não foram dados pela Câmara de Vereadores nem
pelos proprietários em plebiscito, não é legal.
E quando Mundo Novo protesta contra apropriações ilegal de áreas de seu território, o
ódio dos apropriadores espuma e se derrama em ameaças, inclusive de assassínios. É o caso
do sujeito que invade a propriedade alheia, gritando para o proprietário: − “Não se meta
a defender seus bens, seus direitos, se não quer cair no tiro!” “A bolsa ou a vida!” A bolsa,
no caso em tela, significa: uma área de 150 quilometros dos territórios de Alto Bonito e
Sede de Mundo Novo.
Dizem que Quinzinho anda ameaçando dar tiros, fazer defuntos, se seu município tor-
nar a cair.
Acreditará você, Quinzinho, que o Prefeito, os Vereadores e o Povo de Mundo Novo
deixarão de cumprir o dever de defender o nosso município por mêdo de seus tiros ou dos
tiros de seus comparsas?
A legítima defesa, Quninzinho, não é apenas um direito, é também um dever. Dever de
dignidade humana. E este dever, com a graça de Deus, não deixaremos de cumprir!
Você acha que seja um direito de Piritiba apoderar-se de territórios dos distritos de Alto
Bonito e Sede de Mundo Novo contra a determinação da Câmara de Vereadores das {†}
lações atingidas. Nós achamos que Mundo Novo tem o dever de defender sua Aut{†}
Municipal, a integridade de seu território.
O Supremo dirá com quem está a razão.
Sua ameaça de violência equivale a uma declaração “a priori” de desacato à Justiça.
Acontece que “o crime não compensa”. Homem que se apresenta como lider de uma
coletividade, arrotando a “virtude” de Caim! Louvado seja Deus!

Mundo Novo, {†} 1º . 1960. Eulálio Motta






A folha mede 220 x 330mm, o papel é de alta gramatura e baixa lisura. A acidez ocasionou o amarelamento e o desgaste do papel, principalmente na borda direita, comprometendo parte do texto. Há sinais de queimadura no canto esquerdo da borda superior e inferior. O texto foi impresso em prensa de tipos móveis. O tipógrafo cometeu erros em palavras que foram emendadas pelo autor nas linhas 12 e 24. Há também problemas ocasionados pelo afrouxamento dos tipos que deslocou a letra “e”, nas palavras “de” e “que” (linhas 2, 6, 10, 43 e 52). O layout é bastante simples, sem utilização de caracteres especiais e variação de tipo de letra. Foi preservado apenas um exemplar desse panfleto.