ELEIÇÃO – CORRUPÇÃO


Ronda por municípios, antes e depois da eleição de 1976... A corrupção nunca
chegou a tanto, nem mesmo nos ignominiosos tempos de João Goulart!
Um eleitor, “esperto”, inteligente, comentava com outro, que sua mulher teve seus
dentes todos extraídos e uma ordem para o dentista fazer as duas chapas, em troca dos
votos dela e dêle marido. E concluiu: “Aquilo é que é candidato macho!” Assim, para
aquele homem simples, da roça, tal tipo de “negócio” não é corrupção, é uma questão
de machismo.
Outro, muito esperto, comentava que, com seus filhos, genros e noras, tem 8 votos. E
como não tem nada com política, só daria os 8 votos a quem o desapertasse com mil cru-
zeiros. Foi a um candidato (Arena), fez a proposta e “o cara declarou que, infelizmente,
não estava podendo”. Foi ao outro candidato, (tambem Arena), “e a gaita saiu em cima
das buchas”.
Um outro, não matuto, gente da cidade, comentava: - “Tomei um ferro danado!
“Mudei-me de município e recebi uma oferta de 500 cruzeiros por meu voto e não ude
pegar porque não havia transferido o meu título e não havia mais tempo para faze-lo.
“E o meu ferro aumentou quando soube que se tivesse o voto e exigisse mil cruzeiros o
cara me teria paga! “Fui votar em meu município. “Queriam meu voto de graça. “Re-
sultado: votei em branco”.
Um outro comentava, gosando com dose de cinismo: “Para pagamento de uma
despesa forçada, recebi 180 cruzeiros em troca de meu voto. “Votei no comprador?
“Para os bestas...”
Modalidade de corrupção que desta vez funcionou em proporções alarmantes: -
o eleitor importado. Ha municípios onde provavelmente vitorias não teriam sido
vitorias se não tivesse havido o eleitor importado... Sujeira! Houve povoados onde, di-
zem, o voto mais barato custou cem cruzeiros. E comentam que houve compras por
atacado: 20 e até 40 mil a cabos eleitorais. Coisas sabidas e comentadas mas que ninguem
denuncia porque não pode provar. Compradores e vendedores, é claro, não iriam confir-
mar. E ainda poderiam arrumar um processo de injuria e calunia pra o denunciante...
Comicios foram realizados em lugarejos, com cem, cento e tantos, duzentos e mais
carros! Caminhões superlotados, incluindo menores, não raro acontecendo acidentes fa-
tais. Pra que? Pregações cívicas? Demagogia reles, xingamentos, bebedeiras, carnavais
extemporâneos! Milhões de litros de gasolina e oleo queimados nababescamente, estu-
pidamente, neste momento de tanto sofrimento do País com o problema do comus-
tivel!. Louvado seja Desu!
Senhores responsaveis pela Revolução! Senhores responsaveis pelo presente e pelo
futuro do Brasil! Não haverá um grito de acabar com isto, com esta onda de lama
e corrupção? Isto é democracia? Isto é forma de se conseguir o tão apregoado aprimora-
mento democrático? Isto não está desmoralizado a Revolução? Isto não está rasgan-
do, reduzindo a farrapos, a bandeira da anti-corrupção, desfraldada pela Revolução?
Em 1962, comentando corrupção eleitoral, em artigo que publiquei sob o titu-
lo de “Assalto ao poder”, dizia: - “Só ha um grito: -eperar... “Esperar a Revolução!”
E agora? Esperar mais o que? Apelar para quem, para o que? Não sei. Desgraça-
damente, não sei!


Mundo Novo, (Bahia), 20-11-976.

EULÁLIO MOTTA

Do Caderno: “Diairo de um João Ninguem”,
A folha mede 163 milímetros de largura por 240 milímetros de altura. O papel é de baixa gramatura, alta lisura e se encontra amarelado. O texto foi impresso em prensa de tipos móveis. Há um post-scriptum no final do texto, com informações acerca das circunstâncias de sua escrita. Não há muitas variações de tipos e tamanhos de fontes, nem espaço especial entre parágrafos e as linhas são longas. Foi preservado apenas um exemplar desse panfleto.